sexta-feira, fevereiro 24, 2012

Sala, banheira e piscina

Acorda, dona moça! Se vista,
vão demolir sua cama
para fazer um beliche.
Acorda, seu Zé! Sai do balcão,
manda embora o amigo
manda ao diabo o freguês
e vá se mandando também
que vão demolir essas mesas
pr'um drive thru de cerveja.
Engarrafem essa cidade!
O quanto durar, não importa...
Abre a janela! Junta as tralhas!
Larga o sol! Deixa as rosas!
Cuidado que o teto já cai
telha por telha
e vão construir outro teto
sólido, caro, reto
e que não se veja mais luz
além da televisão.
Sala! Banheira! Piscina! Máquinas de evitar depressão!
Sem janela mas com vista
pra família margarina. Sem vizinho
ou porteiro ou amolador de facas
(Esse nordestinos...)

Já pra rua, Tobias! Que aqui só gente autorizada
endinheirada
pode entrar.
Larga a varanda! Larga a quitanda!
Larga os amigos do bar!
Arranja carro e gravata
e vai ver a vida passar, no trânsito,
que nunca para. Para, e nunca
para, e nunca mais nada de vida,
que é perda de tempo.
Junta dinheiro!
e não Pinheiros...
Esquece os avós, esquece o quintal
esquece da infância, que é tempo perdido!
Pega tudo, revende,
aluga um apartamento
e vá ver a vida passar
na tv. Larga a janela!
Vende os retratos! Vende a rua
em que brincou de pegar!
Vende o pai, vende a mãe,
velha inútil, quebrada, antiquada,
e compre uma nova mulher!

E quando a morte chegar
e chamar pelo interfone
diz que não tem negócio
- a alma já foi vendida -
e avisa que ao invés de cova,
flores ou choro de amigos,
prefere uma rodovia
pro povo se esbodegar
e morrer contigo.

Afinal, de que serve a vida?
Tempo perdido...

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